O Ministério Público da Paraíba (MPPB) ajuizou, nesta quarta-feira (4), uma ação civil pública contra a empresa Uber do Brasil Tecnologia Ltda., por racismo religioso praticado por motoristas do aplicativo contra usuários de religiões de matriz africana. A ação, que tramita na 6ª Vara da Fazenda Pública de João Pessoa, busca obrigar a empresa a promover capacitações para seus motoristas, a fim de combater a discriminação religiosa, além de exigir o pagamento de uma indenização de R$ 3 milhões por danos morais coletivos, que deverá ser revertida ao Fundo Estadual de Direitos Difusos da Paraíba (FDD-PB).
A ação é um desdobramento do Inquérito Civil Público 002.2024.016457, instaurado para apurar um caso de racismo religioso ocorrido em 25 de março deste ano. Na ocasião, um motorista da Uber se recusou a transportar uma usuária até um terreiro de Candomblé, cancelando a corrida após enviar uma mensagem racista religiosa. A vítima registrou o ocorrido na Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes Homofóbicos, Étnico-Raciais e Delitos de Intolerância Religiosa da Capital, relatando que o caso não foi isolado, e que outros motoristas da empresa costumam cancelar viagens quando o destino envolve locais de prática de religiões de matriz africana.
Práticas Discriminatórias Recorrentes
De acordo com a promotora de Justiça Fabiana Lobo, autora da ação, investigações confirmaram que outros usuários também foram vítimas de racismo religioso por motoristas da Uber. Um dos relatos incluía um motorista que, após ser solicitado a não ligar música no carro, insistiu em tocar um louvor cristão em alto volume, dizendo que era para “Jesus”, e mandou a usuária descer do carro quando ela sugeriu colocar uma música dedicada a Oxalá. Em outro caso, um motorista questionou uma usuária sobre a religião “Ilê Axé Omidewá” e, após saber que se tratava de um terreiro, também mandou a passageira descer do veículo.
“Apesar do direito fundamental à liberdade religiosa estar garantido pela Constituição e por tratados internacionais, a discriminação religiosa, especialmente contra religiões de matriz africana, continua a ser uma realidade recorrente no Brasil. Em 2023, a Ouvidoria Nacional de Direitos Humanos registrou 1.940 denúncias de violações de liberdade religiosa, sendo 276 delas envolvendo adeptos de religiões afro-brasileiras”, afirmou Lobo.
Intolerância Religiosa em João Pessoa
Na cidade de João Pessoa, a prática de racismo religioso tem sido uma constante, com relatos frequentes de discriminação contra praticantes de religiões de matriz africana. A promotora destacou que essas discriminações não se limitam a ofensas verbais, mas também se traduzem em violência física, vandalismo nos locais de culto e até mesmo no medo das vítimas de sofrerem represálias por usarem suas indumentárias religiosas em público.
“Infelizmente, o racismo religioso atravessa violentamente a vida dos praticantes de religiões afro-brasileiras. É preciso que o Poder Público adote medidas eficazes para combater essas violações”, completou a promotora, ressaltando a necessidade de uma resposta mais contundente, não só no âmbito penal, mas também por meio de ações preventivas.
Capacitação e Indenização
A ação do MPPB requer que a Uber promova treinamentos obrigatórios para todos os seus motoristas, com o objetivo de combater o racismo religioso, e que também desenvolva campanhas educativas voltadas para o público em geral. Além disso, o MPPB solicita que a empresa seja condenada a pagar uma indenização por danos morais coletivos, no valor de R$ 3 milhões, para compensar as vítimas dessa discriminação e fortalecer a luta contra o preconceito religioso.
Em agosto deste ano, uma audiência de conciliação foi realizada entre o MPPB e a Uber, mas a empresa não aceitou a proposta de acordo, que incluía a capacitação dos motoristas e uma campanha publicitária sobre racismo religioso. Segundo Lobo, as medidas adotadas pela empresa foram “tímidas”, e a Uber não demonstrou empenho em implementar ações significativas de conscientização.
Com a ação ajuizada, o Ministério Público busca agora garantir que a Uber adote as providências necessárias para evitar que motoristas continuem a praticar atos de racismo religioso, além de assegurar uma reparação justa para as vítimas desse tipo de discriminação.